terça-feira, 30 de abril de 2013

Teus lábios são labirintos...


"Toco a tua boca, com um dedo toco o contorno da tua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse, e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e te desenha no rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade eleita por mim para desenhá-la com minha mão em teu rosto e que por um acaso, que não procuro compreender, coincide exatamente com a tua boca que sorri debaixo daquela que a minha mão te desenha.

Tu me olhas, de perto tu me olhas, cada vez mais de perto, e então brincamos de cíclope, olhamo-nos cada vez mais de perto e nossos olhos se tornam maiores, aproximam-se, sobrepõem-se, e os cíclopes se olham, respirando indistintas, as bocas encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os lábios, apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando nas suas cavernas, onde um ar pesado vai e vem com um perfume antigo e um grande silêncio. Então, as minhas mãos procuram afogar-se nos teus cabelos, acariciar lentamente a profundidade do teu cabelo, enquanto nos beijamos como se tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos vivos, de fragrância obscura.

E se nos mordemos, a dor é doce; e se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego, essa instantânea morte é bela. E já existe uma só saliva e um só sabor de fruta madura, e eu te sinto tremular contra mim, como uma lua na água."

(O Jogo da Amarelinha - Capitulo 7 - Julio Cortázar)

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Do que permanece florido



Não sei por que floresceram em meu rosto
os olhos profundos e os versos raros que há em ti.
Floriram por acaso, ao sol da primavera
sem mesmo haver primavera ou sol em mim.
 
Não sei por que, fiquei assim florida: se o orvalho acre os queima
(Ponho as mãos sobre os olhos para os proteger!)
Tão estranho! Jazerem ainda, em minha face,
esses olhos e versos...
Se já é inverno, e não mais os posso ver.


(Juliana Alves - 15/11/12)

Coração Primaveril

  Das invernais madrugadas não me recordo mais. Senhor dos tempos da ventura despiu-me de toda a névoa, vestiu-me de amanhecer...