sábado, 24 de março de 2012

Outonal



Hoje sou apenas madeira de folhas esparsas,
Galhos tortuosos, ductos labirínticos falidos
Da vívida seiva de outrora...
Vazia de qualquer guarnição,
Ao expectador desatento uma inóspita visão.
Pois engana a aparência, 
fortes e profundas são minhas raízes!

Na penumbra outonal, da luz que desce...
Silente... Sem pressa, nua e ocre,
firme em terra fecunda, espero
minha nova e aconchegante roupagem...
O verdejante agasalho, de um merecido
tempo vindouro, por mim se alastrar...

Oh, Crespusculário da redenção,
lança em mim as bênçãos de um afago!
Nas noites que logo invadem,
dos amanheceres de relva orvalhada
e coloridos solos folhados!

Que permaneça longínquo o derruir da primavera,
a morte das folhas nascidas em dia ainda frio,
desabrochadas no floral esplendor da estação,
tingidas ao abrasivo calor de uma existência...
Mas, que guarde ocluso o perfume das emoções vividas,
como o gene essencial aprendido de um amanhã!

Deixa-me inteira desfolhar! 
Para que em exuberância colorida,
depois ainda que sobreviva ao inverno...
Centelha de vida eu possa florir
às primícias de um raio divino solar!

(Juliana Alves)

domingo, 18 de março de 2012

Ad Infinitum

 
Estávamos protegidos. Alinhados. Demorávamos na vida e no riso. Vivíamos entre nós distantes, um ao lado do outro. 
Fomos, só até a página dois (e a alegria foi quase um susto). 
Nos desencontramos dentro dos números, silêncios e verbos.
Rasguei todos. Ele, tinha que tudo. 
Eu, queria que esse tudo se resumisse à minha vontade de felicidade. Nada (re)feito. É que quando sobra história, o que falta é sentimento. Faltei. Faltamos. Coração é estrada que devolve caminhos. É casa. Asa. Labirinto. O meu, poesia, nasceu com um quê de ad infinitum. E precisa saber de mim desarmada, noutro abraço, noutro mundo - até que durem as letras, os tempos e os versos.

(Priscila Rôde)

sexta-feira, 16 de março de 2012

Nua...



Se todo o ser ao vento abandonamos
E sem medo nem dó nos destruímos,
Se morremos em tudo o que sentimos
E podemos cantar, é porque estamos
Nus em sangue, embalando a própria dor
Em frente às madrugadas do amor.
Quando a manhã brilhar refloriremos
E a alma possuirá esse esplendor
Prometido nas formas que perdemos.
Aqui, deposta enfim a minha imagem,
Tudo o que é jogo e tudo o que é passagem.
No interior das coisas canto nua.
Aqui livre sou eu eco da lua
E dos jardins, os gestos recebidos
E o tumulto dos gestos pressentidos
Aqui sou eu em tudo quanto amei.
Não pelo meu ser que só atravessei,
Não pelo meu rumor que só perdi,
Não pelos incertos atos que vivi,
Mas por tudo de quanto ressoei
E em cujo amor de amor me eternize

(Sophia de Mello Breyner Andresen)

quinta-feira, 15 de março de 2012

Prece dos Atordoados


“Oh, Deus...
 Perdoai aos que a alma atordoada
violentamente grita, lateja e clama...
Trazei calmaria onde notai ventania,
enchei-me do Seu Amor para acolher o que não quero aceitar...
E transformai o que me tortura em luz e resignação.
Amém!”

(Juliana Alves)

sábado, 10 de março de 2012

Desfazendo o(s) nós do coração


A verdade é que você nunca me perdeu realmente, sempre fui sua, se não de corpo presente, mas de alma, pensamentos, coração sempre perenes na busca de lhe trazer pra perto, concretizar um amor, que só existiu e existe em meu peito...

O que é o corpo? Sagrado? O seu? O meu? Aponte a arma, jogue a primeira pedra quem nunca teve o seu profanado! Por escolha, por fraqueza, por prazer, dor, carência, indecisão, confusão, tesão, no esbarrar de uma mente perniciosa, não importa o motivo...

E a alma, e o coração? De todos esses são impuros? São seres vis, não dignos de qualquer afeição? São todos condenados ao desprezo de uma humanidade desumana que não enxerga a si própria e quer condenar o que ela mesma comete, achando-se o poço da perfeição... e esquecem que perfeição e humanidade são antagônicos!?

Se estamos aqui na Terra é pra errar, acertar, aprender com cada tombo, aparar nossas arestas e nos tornar cada vez mais próximos da essência divina que nos foi dada.

Se errei e erro, tenho esse direito! Isso não me torna menos valorosa, perante nem os olhos de Deus, que me ama, me acolhe, entende minhas dores e me perdoa, quanto mais aos olhos de um igual!

Mas há de chegar o dia, que realmente me perderá, que guardarei meu amor, esse valente cansado de guerra, e não mais buscarei a você para entregá-lo, pois se as questões corpóreas e de aparência lhe atingem, não é merecedor das questões do amor e da alma...

Como li e acredito, quem não tem preparo pra aceitar erros e imperfeições, e perdoar, não está pronto para amar! Amor não é concedido ao perfeito, senão seria muito fácil. Amor é para os fortes e nobres, capazes de enxergar o que está por detrás das aparências, das fraquezas decorrentes, na sinceridade de cada cuidado, de cada carinho, de cada perdão e acolhida, enfim no íntimo do coração!

(Juliana Alves)

Do Charme Necessário

Menino - ... mas me explica como funciona fazer charme, você não dá moral pra ninguém é?
Eu - Seja educada, transmita coisas boas, abra seu melhor sorriso, ouça, fale, se encante e encante, mas não ultrapasse o limite seguro, não conceda demais... Seja doce, mas saiba se preservar, sem que ninguém desconfie que no fundo você queria mesmo é poder confiar e se jogar!
(Juliana Alves)

quinta-feira, 8 de março de 2012

O amor não acaba, nós é que mudamos


Um homem e uma mulher vivem uma intensa relação de amor, e depois de alguns anos se separam, cada um vai em busca do próprio caminho, saem do raio de visão um do outro. Que fim levou aquele sentimento? O amor realmente acaba?

O que acaba são algumas de nossas expectativas e desejos, que são subtituídos por outros no decorrer da vida. As pessoas não mudam na sua essência, mas mudam muito de sonhos, mudam de pontos de vista e de necessidades, principalmente de necessidades. O amor costuma ser amoldado à nossa carência de envolvimento afetivo, porém essa carência não é estática, ela se modifica à medida que vamos tendo novas experiências, à medida que vamos aprendendo com as dores, com os remorsos e com nossos erros todos. O amor se mantém o mesmo apenas para aqueles que se mantém os mesmos.


Se nada muda dentro de você, o amor que você sente, ou que você sofre, também não muda. Amores eternos só existem para dois grupos de pessoas. O primeiro é formado por aqueles que se recusam a experimentar a vida, para aqueles que não querem investigar mais nada sobre si mesmo, estão contentes com o que estabeleceram como verdade numa determinada época e seguem com esta verdade até os 120 anos. O outro grupo é o dos sortudos: aqueles que amam alguém, e mesmo tendo evoluído com o tempo, descobrem que o parceiro também evoluiu, e essa evolução se deu com a mesma intensidade e seguiu na mesma direção. Sendo assim, conseguem renovar o amor, pois a renovação particular de cada um foi tão parecida que não gerou conflito.


O amor não acaba. O amor apenas sai do centro das nossas atenções. O tempo desenvolve nossas defesas, nos oferece outras possibilidades e a gente avança porque é da natureza humana avançar. Não é o sentimento que se esgota, somos nós que ficamos esgotados de sofrer, ou esgotados de esperar, ou esgotados da mesmice. Paixão termina, amor não. Amor é aquilo que a gente deixa ocupar todos os nossos espaços, enquanto for bem-vindo, e que transferimos para o quartinho dos fundos quando não funciona mais, mas que nunca expulsamos definitivamente de casa.

(Martha Medeiros)

terça-feira, 6 de março de 2012

Das Faces do Amor


Ah o Amor, vivemos a buscá-lo, o idealizamos sob a forma de pureza, intensidade, perfeição, idealização do ser amado, e que só é bom se seguir o protocolo da correspondência, do conto de fadas, da bonança infinda... Mas a sua procura, focamos nessas qualidades e nos assustamos quando vivenciamos coisas muito diferentes disso, então criamos outra visão: o amor nos faz sofrer, o amor é algo impossível, é a dor maior que se pode sentir, decepção... E criamos aversão, medo de se apaixonar, medo de sofrer.. E nesse processo damos vestes, máscaras ao amor que não são suas, o deturpamos... Muitos se corrompem, e passam a ser adeptos das relações descartáveis, sem envolvimento, superficialidade no sentimento e profundidade em sexo... Quem causa isso tudo não é o amor, somos nós mesmos, com nossas falhas, fraquezas e faltas, mas não admitimos isso e pomos a culpa no amor... Mas ele não desiste de nós, lá no fundo, abafado, sufocado vira e mexe se debate, cutuca o nosso ser.. O Amor tenta nos avisar que sua essência é diferente do que o forçamos vestir... Esse aviso vem sob a forma de solidão, vazio, e o se sentir perdido em meio a tanta mesquinharia e falta de valor sentimental das ações humanas... Quem consegue e se permite ouvir o chamado do amor, começa a entender que ele é algo bem maior, é ser independente, tem várias faces, e todas soberanas, superiores a tudo que acreditamos: maior que a posse, promiscuidade, raiva, mágoa, maior até que o ser amado, ao qual o juramos, pois (eu) acredito que somos capazes de abandonar amores (físicos), mas o amor como sentimento sempre está em nós, sob várias formas: Amor-próprio, amor ao próximo, amor a outro que vier, amor à vida, amor à natureza, enfim, amor sempre existe e existirá só muda-se o que/ a quem amar... E desse amor não devemos desistir nunca e muito menos corrompê-lo... Pois é a forma pura, genuína e dignificante deste que nos torna o melhor que podemos ser, não importando quem ou o que o fez surgir em nós... 
Viva o Amor!!! Pleno, sem amarras, sem conceitos, fórmulas, ciúmes, posse. 
Muitos o julgam ser uma causa perdida, mas como uma eterna amante de causas perdidas, decidi que só quero "O AMOR" o resto é consequência!

(Juliana Alves)

segunda-feira, 5 de março de 2012

"E quando a noite era só breu, enfeitava os cabelos com estrelas para clarear os pensamentos." (Renata Fagundes)

♫♪...When she was just a girl
She expected the world
But it flew away from her reach
And bullets catch in her teeth

Life goes on
It gets so heavy
The wheel breaks the butterfly
Every tear, a waterfall
In the night
The stormy night
She closed her eyes
In the night
The stormy night
Away she flied...♫♪

domingo, 4 de março de 2012

Demasiadamente humana...


Entre mim e mim... há vastidões imensas...
Para a navegação dos meus desejos afligidos ...
Descem pela água, minhas naves revestidas de espelhos...
Cada lâmina, arrisca um olhar... e investiga o elemento que a atinge.
Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza...
só recolho o gosto infinito das respostas que não se encontram...
Virei-me sobre a minha própria experiência... e contemplei-a.
Minha virtude erra essa errância por mares contraditórios...
e este abandono para além da felicidade e da beleza...
Ó Meu Deus, isto é minha alma...
Qualquer coisa que flutua sobre este corpo efemêro e precário.
Como o vento largo do oceano...
sobre essa areia passiva e inúmera...

(Cecília Meireles)

sexta-feira, 2 de março de 2012

Soneto do Tempo Perdido


Vai-se o tempo das cerejeiras rubras, doces,
obstinadas a avançar meu remanso adentro.
Velho tempo das noites arrebatadas em minha mente,
em que o sangue fluía silente, como o vento pelas frestas!

Tempo – senhor consonante das coisas vivas,
Do seu hálito fleumático aos confins do esquecimento...
Tempo – dos ensejos e das horas renunciadas
Ao ouro raro e inútil dum lamento...

O tempo, chaga pungente ainda exposta,
Coração palpitando sobre a lama - pranto dos desolados.
Tempo perdido, sangue derramado...

Resto de amor que se deixou no leito, do que ainda clama...
Horizonte de guerra atravessado, pelejado...
Pelo corpo audacioso duma chama, a queimar solitária.

(Juliana Alves)

quinta-feira, 1 de março de 2012

Dos suicídios íntimos

"Não adianta chamar quando alguém está perdido, procurando se encontrar..." 
(Ovelha negra - Rita Lee)
Quando chegamos a esse ponto de inflexão ao próprio eu em busca de repostas, (re)formarmos nossa identidade, passamos por essa auto-análise surreal... Pegamos-nos sem rumo, sem prumo, senão o de dentro de nós mesmos... 
Tudo que precisamos, todo o substrato está ali no nosso íntimo, o que nos cerca, vemos, mas não nos edifica, não nos apetece, porque não sabemos o que de fato prescindimos... 
É árdua essa busca pelo lume existencial, solitária jornada que requer coragem de ver-nos em reflexo, nossa face sem máscaras e matar o que de nós não nos serve, não nos é de fato, para originar nossa exata essência, dar forma ao próprio eu... 
Mas, uma verdade, é que muitas vezes são necessários inúmeros suicídios íntimos, para renascer mais verossímil ao cerne do que nos foi traçado no divinal, e esse ciclo mitológico de morte, vida e reconstrução do nosso eu, penso ser nossa mais primorosa evolução!
                                          (Juliana Alves)

Coração Primaveril

  Das invernais madrugadas não me recordo mais. Senhor dos tempos da ventura despiu-me de toda a névoa, vestiu-me de amanhecer...