domingo, 3 de abril de 2011

"Mas amar é querer que a alma do outro seja feliz, não importa como, onde e assim por adiante..." (Hoje é dia de Maria)



Depois de um tempo, a gente entende que não há distância para aqueles que se amam, contrariando o que dizem a quilometragem, a diferença de fuso, o tanto de afastamento dos olhos. Porque o olhar que importa é o olhar que ama, é o olhar que sente, é o olhar que abençoa, e esse olha de qualquer lugar. A gente entende que estar perto do corpo não significa necessariamente estar no coração. Porque para se estar no coração é preciso mais do que a presença física de olhos, ouvidos, toque, pele, voz. Para se estar no coração, adivinhe só: é preciso amor. E o amor é essa ponte que nos leva a qualquer destino de maneira instantânea.

É a facilidade do encontro, a beleza dele, o riso dele, a intimidade que é descanso, a história dele toda, que cria e mantêm proximidade, não é o corpo. O corpo é a casa querida e temporária, às vezes desejada, de quem a gente ama, mas não é quem a gente ama. E nós podemos estar longe da casa e desfrutar dos sentimentos que tudo o que ela abriga nos desperta, um jeito de estar lá. Sem poesia, um corpo não floresce diante do nosso olhar. A primavera que reconhecemos numa outra vida tem a ver com a primavera que acontece em nós quando a nossa emoção, de alguma forma, a encontra. Parece mágico e é também. Mas é afeto, sobretudo.

É claro que quando se ama, a gente quer estar perto fisicamente. Poucas coisas são tão prazerosas quanto apreciar ao vivo o sorriso bom de quem amamos, as diferentes maneiras de expressar com o corpo as mais variadas emoções. Acontece que, por uma fantástica capacidade do amor, nós conseguimos estar próximos mesmo quando não estamos. O sentimento não tem paredes, já notou? Quem tiver o coração todo desenhado com esquadro e compasso talvez não consiga entender. Para ver o que não está disponível do lado de fora, é preciso conseguir ver do lado de dentro. Esse, seja qual for a distância, é o olhar que faz toda diferença.

Na vizinhança dos vinte anos, um namorado me deu um livro lindo do Richard Bach, autor de “Fernão Capelo Gaivota”, intitulado “Longe é um lugar que não existe”. Um livro fino, pouco texto, e ao mesmo tempo grandioso. Num trecho, o autor faz uma indagação da qual nunca esqueci, algo mais ou menos assim: “(...) se você quer estar com alguém a quem ama, já não está lá?” A mente é capaz de coisas incríveis, mas, em geral, nós aprendemos a lidar com a vida de uma maneira muito restrita, muito aquém das possibilidades das quais potencialmente dispomos. Nós nos acostumamos a experimentar os nossos cinco abençoados sentidos como se tudo girasse em torno deles de forma exclusiva. Mas, depois de um tempo, depois de algum caminho percorrido, a gente começa a descobrir que não é só isso. Por mais distante que seja, nós podemos ir onde o sentimento nos levar. Podemos ir e sentir um conforto imenso ao encontrar o que está lá. Quem está lá.

(Ana Jácomo)

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